Cinema, esquizofrenia e a nova psiquiatria
Autor: Estéfano Ubiali
A morte de Eduardo Coutinho deixou a sociedade estarrecida no dia 02 de fevereiro. Seu filho Daniel, de 41 anos, foi preso em flagrante pelo assassinato do cineasta, após também esfaquear sua mãe e a si mesmo.
Com a suspeita de que o parricida seja portador de esquizofrenia, a tragédia inspirou o poeta, crítico de arte e literário Ferreira Gullar, que estendeu a análise do ocorrido para uma bela e muito realista crítica sobre o rumo incerto que o tratamento dos transtornos graves em psiquiatria vem tomando nas últimas décadas.
No texto publicado em 16/02 na Folha de São Paulo (Ilustrada), intitulado Tragédia desnecessária, descreve o preconceito ao qual os pacientes psiquiátricos e a doença mental em si ainda são submetidos, a política pública de saúde que progressivamente leva a desassistência dos doentes e a forma irresponsável e incoerente com a qual se têm lidado com tal tema.
Segundo ele, muita gente defende a (absurda) tese de que não existem doenças psiquiátricas e que são apenas formas diferentes de enxergar o mundo. Isso parece uma postura “avançada, aberta, antirrepressiva” e que pega bem. “Criaram até um movimento que se intitula ‘antimanicomial’, que visa, de fato, acabar com as clínicas psiquiátricas, uma vez que o que se chama de manicômio não existe mais”.
Sabe-se que no passado, antes do advento dos neurolépticos e demais medicações para o controle dessas doenças, por desconhecimento e falta de preparo, os doentes foram submetidos a tratamentos cruéis e agressivos. Mas isso não ocorre há muitas décadas. A irresponsável manutenção dessa visão demoníaca da psiquiatria, como bem aponta o autor, tem acarretado no fechamento de leitos hospitalares e aumento da mortalidade. Portanto, prejuízo da saúde mental e física desses não-pacientes.
Quem tem um familiar portador de transtorno mental grave em casa está cansado de saber disso.
É evidente que as instituições psiquiátricas existentes no Brasil, assim como a assistência à saúde como um todo, estão ainda longe da perfeição. No entanto, é nosso dever lutar para melhorá-las, e não para destruí-las.
O texto é imperdível. Parabéns a Ferreira Gullar.
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